segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Quem merece?




Acordo e abro os jornais, logo em seguida, acesso as redes sociais. Em todos os meios de informação constato uma declaração, no mínimo, absurda, pra não dizer monstruosa, oposta ao que Sthefane Hessel – um dos agentes criadores da Declaração dos Direitos Humanos –, e tantos outros seres humanos, verdadeiramente humanos, declararam no documento mundialmente conhecido como "Declaração dos Direitos Humanos", que no dia 10 de dezembro completou 66 anos.

A declaração descabida, cruel, criminosa a qual me refiro é a do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), que cumpre seu sexto mandato e foi reeleito nas últimas eleições com mais de 460 mil votos pelo estado do Rio de Janeiro. 

No dia 9, (véspera do Dia da Declaração dos Direitos Humanos), o parlamentar afirmou que “não estupraria a também deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) porque ela não merecia”.

De todos os adjetivos que busco para definir essa sua "declaração", sinto que a que mais se aproxima é quando a percebo como desumana, própria de um ser incapaz de se colocar no lugar do outro. Um ser que não percebe que o outro poderia ser ele mesmo ou alguém de sua família, um amigo. Um ser que não sabe sequer o que é ser humano.

Dados apresentados pelo 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública dão conta de que mais de 50 mil pessoas (incluindo homens e mulheres) foram estupradas em 2013. Por sua vez, pesquisa apresentada pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), em março deste ano, mostra que 88,5% das vítimas são do sexo feminino, 51% de cor preta ou parda e 46% não possuem ensino fundamental. O estudo do Ipea revela, ainda, que mais da metade das vítimas de estupro no Brasil são menores de 13 anos.

No início da semana participei de uma reunião com o Governador Geraldo Alckmin e mulheres que coordenam trabalhos partidários (PPS, PV, PSB, PSL, PSDB) em prol da participação política das mulheres. Nosso objetivo foi discutir ações e políticas públicas efetivas a serem executadas em favor das mulheres do estado de São Paulo. Isso porque o nosso país é o 81º país em desigualdade de gênero entre 134 nações. Isso também porque mesmo sendo as mulheres, atualmente, a maioria entre a população brasileira, sendo 40% delas as responsáveis dos lares brasileiros, são também as que mais sofrem das mais variadas formas de preconceito e violência, com a falta de equiparação social e com menor representação política tanto no legislativo quanto no executivo.

Penso que a declaração desumana de Bolsonaro serviu para a constatação de que a violência contra mulher persiste, existe. Diante dessa realidade, fica evidente o quanto temos que avançar para uma convivência mais digna, respeitosa, sem preconceito, imposições, invasões, como também no processo democrático com a participação mais consciente que permita escolhas mais maduras, responsáveis.

Em tempos em que se discute sobre merecimento, lembramos que a palavra “meritocracia” vem do latim mereo, e significa merecer, obter. Segundo essa definição, as posições hierárquicas são conquistadas por merecimento, com base em valores como a competência.

Assim sendo, se para Bolsonaro a deputada Maria do Rosario não merecia ser estuprada, a pergunta latente é: quem mereceu, merecia ou merece? A resposta, como todo ser humano sabe, é NINGUÉM MERECE! Não existe quem mereça. Não há nenhum valor humano para quem é estuprado. Há apenas crueldade do algoz que humilha, impõe, machuca, traumatiza.

Eu, você, nossos filhos e filhas, irmãos e irmãs, amigos e amigas merecemos segurança que garanta decência, humanidade e respeito de quem elabora e fiscaliza o cumprimento da lei.

Em nosso país, a autoridade de um agente político é concedida por cada um de nós. "O poder emana do povo" versa a carta magna em seu Art. 1º. Após esses acontecimentos, quem sabe muitos dos eleitores de Bolsonaro possam indignar-se e, portanto, no futuro dizer: "Só não voto no Bolsonaro porque ele não merece".

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